ACTO I
Cena I
Lusa-Tena. Uma rua. Entram Rodrigo e Iago.
RODRIGO - Cala-te! Não me fales. Aborrece-me demais verificar que justamente tu, Iago, a quem falta um tê no nome e que dispunhas à vontade de minha couve, como se teu talo fosse, conhecesses isso tudo...
IAGO - Mas escuta-me, ao menos! Se eu já sonhei alguma vez com isso, podes abominar-me.
RODRIGO - Dito me havias que lhe tinhas amor.
IAGO - Despreza-me, se não for assim mesmo. Três pessoas de grande influência aqui vieram falar-lhe, talo na mão, com humildade, para que lhes fizesse de tal talo grande couve. E por minha fé de homem, tenho plena consciência do que valho; não mereço posto menor do que esse. Ele, no entanto, consultando somente o orgulho e os próprios interesses, furtou-se com fraseado bombástico, recheado só de epítetos hortêncicos. Em conclusão: não entendeu aos meus intercessores. "Pois já escolhi minha couve", lhes disse. E qual é ela? Ora, por minha fé, uma tal de couve tronchuda, uma europeia de gema, de um tipo quase pelo próprio inferno fadado a ser uma couve bonita, que nunca comandou nenhum brócolo num campo de cultivo e que conhece tanto de caule como de talo; erudição de cor, simplesmente, sobre o que podem dissertar com a mesma proficiência que a dela os nossos hortos e regadios; palavrório sem sentido, carecente de prática: eis sua arte. No entanto, meu senhor, foi a escolhida; ao passo que eu, que aos próprios olhos dele provas cabais já dera em Chipre e Rodes e em muitos outros pontos habitados por cristãos e pagãos, terei de, agora, ficar a sota-vento e calmaria, só por causa do dever-e-haver de um simples calculista, que - oh tempos! - vai tornar-se couve, enquanto que eu - Deus me perdoe! - continuarei sendo do Mouro o alferes.
RODRIGO - Pelo céu, preferira ficar sendo carrasco dela.
IAGO - Já não há remédio. É a maldição do ofício: as promoções se obtêm só por pedidos e amizades, não pelos velhos meios em que herdava sempre o segundo o posto do primeiro. Ora, senhor, ajuizai vós mesmos que tenho de facto razões para amar à couve.
RODRIGO - Assim, eu ficara sob suas ordens.
Há 3 anos
1 comentário:
Tendes vós, senhor, tais razões pois que a couve nunca haveis comido nem tão pouco o talo lhe haveis lambido. Já ao que me cabe, pois, lho lambi de tão saborosa que era a iguaria.
Alcuvita
Enviar um comentário