Isto não começa aqui.
Começa antes…
As histórias começam sempre antes de começarem
E isto não é uma história
Há aqueles que a desobedecer obedecem
A desobediência também é uma obediência
A obediência a um contexto de desobediência
Obediência à coacção à desobediência
Ou a tomada casual
da carruagem da desobediência
Com destino à desobediência obediente
Fumavam charros nos 60s
Porque estava na moda
Hoje cinquentões neoliberais
Cinzentos, resignados e vazios
Proíbem-no aos filhos
Que lhes desobedecem por desobedecer
E senti-me um Fernando Pessoa naquele lugar
Estranho a ali
Estranho a si
Estranho da gente de aí
Exterior
Transparente
Diferente
Elegante
E louco
Olhado
Desprezado
E tive um espasmo de realidade
Um sabor momentâneo e fortuito
Como quando se entra numa porta
Ou se abre uma janela
E se apanha uma corrente de ar
(E se foge)
Estão várias portas abertas
Há várias portas abertas
Doors of perception
Alinhadas
Translúcidas
Quase imperceptíveis
Podes entrar e sair
E nunca és o mesmo
Podes entrar e sair
E nunca entras o mesmo
(Como se conseguiria fazer versões de canções para crianças
Mas boas
Alternativas
Velvetianas?)
(colocar esta parte entre parêntesis)
Se um é o feiticeiro da tribo
Absorto e absorvendo o ritual
O outro é o próprio sopro do ritual
A força divina
Que irrompe, fugaz
Olho para o relógio
…
21.05
Não que queira saber as horas…
Quero sim fazer pensar que quero saber as horas
As pessoas geralmente querem saber as horas
Na sociedade é importante querer saber as horas
E eu represento obedientemente este papel social:
Um cidadão sério e responsável
jantando fora um crepe bretão
Tentando passar despercebido numa sala cheia de gente
Ocultar o meu estado
E esconder a chave do meu cérebro
Queria eu mesmo perdê-la
Eu próprio me esquecer
Onde deixei a chave
Num pântano…
Num rio…
Incógnita…
Perdida…
Talvez atada às minhas costas ou testa
Mas me-invisível
O homem da mesa ao lado topou-me
Viu-me nos olhos quem eu era
Para além das janelas com cortinas corridas
Viu o turbilhão
Que turbilha na minha cabeça
E assustou-se…
Fugiu…
O novo não sabe quem sou.
Estou a salvo.
Sorrio.
Ou penso que sorrio
Tenho uma imagem mental de uma gargalhada irreal
Como de uma personagem-vilão de filme de terror série-b
Com olhar diabólico
Falso
Exagerado
É um filme!
“Não é real”
Todos o sabemos!
Todos fingimos que não (sabemos)
Todos nos esforçamos por esquecer que sabemos
São as regras do jogo
Não teria piada de outra forma
E todo este retrato mundano
Me lembra Cesário Verde
Cenas da vida real
Reais
Urbanas
Com cheiro a peixe
A suor
A gente
Os bêbedos cantam.
Os drogados tocam guitarra.
É claro…
São linhas que se cruzam
Mas não se tocam
O licor sai da garganta a 100 à hora
Como expulso de um canhão
A droga torna-te etéreo
Como um gás letal que se propaga
Lenta
Hipnotica
Seguramente
Com a certeza que te tomará
Como um puto de bairro
Viveu descalço
Sofreu como todos os outros
Mas vivia num buraco com uma família feliz
E guarda com um sorriso as canções de criança
(se calhar vou tirar a frase…
Não! Riscá-la!
Apaguei-a.
Agora não sabem o que escrevi.)
(É bom inter-agir com o público)
Faço uma dança
Comendo o gelado
Invento uma dança
Comendo o gelado
E se esta caneta deixar de escrever?
(no sentido figurado
E metaforicamente)
E escrevo isto nas costas da Europa…
Nesta e na outra
(metaforicamente
E no sentido figurado)
Apresentava-se sempre:
“Chamo-me Miguel.
Sou de Portugal”
Pedaços de histórias que nunca se irão escrever
Personagens que nunca hão-de se encontrar
E conhecer
E por isso não existirão…
Cruzados…
Como a marca que lhe fez a bala
Mas se um dia se conhecerem?
Será Deus?
Será o Destino?
Será a Arte?
Será a Arte-Deus?
Será Deus a Arte?
Olhou para ela
Aproximou-se
(ou melhor, ao contrário)
E no seu ar educado
E aristocrático disse:
“Olá! Queres foder comigo?”
O passeio estava ocupado por três jovens da rua
ou ocupado pela percepção de três jovens da rua
Teve medo
Respirou
Desviou o olhar
E passou
Passou…
Sujeitos diferentes
Mas o mesmo…
E sentou-se aqui para escrever estas linhas
Levantou-se
Prosseguiu
Nesta cidade nunca por ele assim vista
Nesta cidade nunca vista
Nesta cidade acabada de criar
Nesta grande cidade acabada de criar
Podem chamar-lhe Bogotá…
Há 5 anos
2 comentários:
e onde é que se pode ouvir isto?
Por enquanto só ler...
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